Aumentar para diminuir

Imagem ilustrativa.

GUILHERME LAPA | O atual presidente da República, o vice-presidente Hamilton Mourão, e um grupo de Senadores eleitos em outubro, têm manifestado a intenção de alterar a Constituição, aumentando de 11, para 16, o número de ministros do Supremo Tribunal Federal, a duração dos seus mandatos, a idade de suas aposentadorias, e até mesmo de impor limitações ao alcance de suas decisões.

Para eles, os juízes do STF deixaram de ser meros expectadores das provas trazidas ao processo, passando a uma atividade mais atuante, proativa e protagonista, razão pela qual necessitam ser limitados, enquadrados, de modo a limitar a sua atuação.

Mas é bom relembrar que o ativismo judicial remonta à Segunda Grande Guerra Mundial, quando surgiu a necessidade de uma atuação mais marcante de modo a tornar efetiva declarações de direitos que inovaram o mundo, a exemplo da Declaração Universal de Direitos Humanos e as novas Constituições democráticas surgidas.

Foi com base nesse ativismo que os direitos expressos nas Constituições deixaram de ser meramente programáticos, passando a efetivos, sendo o seu cumprimento exigido do Estado, além de transformar radicalmente a interpretação da legislação infraconstitucional, que passou a ter como parâmetro o respeito às normas constitucionais.

No Brasil, a intenção de elevar o número de ministros do STF não é novidade. Em 1930, Getúlio Vargas reduziu de 15, para 11, e em 1965, na ditadura militar, foi aumentado de 11, para 16. Na Venezuela, Hugo Chaves fez o mesmo, passando de 20, para 32, o número de ministros, momento em que jogou pra dentro da Suprema Corte seus aliados, permitindo, a partir daí, a concretização de todos os seus horrores antidemocráticos.

Em todos esses momentos, tanto aqui como acolá, a ideia foi sempre a mesma: limitar a atuação da Corte Suprema, restringindo os seus poderes, de modo a comprometer a independência que os magistrados devem possuir. E a explicação aqui é simples: coube ao STF limitar a ânsia ditatorial do atual presidente da República em diversos momentos, a exemplo do momento em que garantiu autonomia a prefeitos e governadores para determinarem medidas para o enfrentamento ao coronavírus, contrariando o seu entendimento segundo o qual somente a ele caberia tal atribuição. Não consigo imaginar o que seria do povo brasileiro sem essa decisão.

Isso é o que chamamos de “sistema de freios e contrapesos”, consistente no controle do poder executivo pelo poder judiciário que, por sua vez, se vale da Constituição Federal e das outras leis, para garantir que o poder não será exercido de maneira arbitrária e que as demandas sociais serão efetivamente cumpridas como, por exemplo, o direito à saúde.

Mas, caso Bolsonaro se reeleja, e consiga essa ampliação, passaria a contar maioria ampla na Corte. Além de Nunes Marques, e André Mendonça, ele teria mais dois nomes para escolher para as vagas de Ricardo Lewandowski, e de Rosa Weber, que se aposentam no ano que vem. Com as cinco novas vagas hipoteticamente a serem criadas com a mudança, teria, ao todo, nove indicações diretas, abrindo espaço para a presença de nomes alinhados com o governo.

Mas há um pedra fundamental no caminho dessa mudança: ela é inconstitucional. Isso porque há em nossa Constituição Federal assuntos que sequer podem ser objetos de emenda, a exemplo da Separação de Poderes, princípio frontalmente a ser atingido caso seja aprovada, visto que a sua real intenção é amesquinhar o Poder Judiciário, tornando o STF apêndice do governo, ferindo de morte a sua plena e necessária independência.

Guilherme Lapa - Advogado.