Celular sem carregador: pode ou não pode?

Imagem ilustrativa.

LERROY TOMAZ | Os direitos do consumidor, em mais de uma oportunidade, já foram pautados aqui nesta coluna, sendo sempre abordados com recortes diferentes. Já tratamos, por exemplo, da proteção ao tempo útil do consumidor (leia clicando aqui), de negativação indevida no SPC (clique aqui e leia), da Black Friday (veja aqui) e do próprio Dia Mundial do Consumidor (disponível aqui), comemorado todos os anos em 15 de março.

Um dos maiores desafios ao escrever sobre o assunto é dar ao texto uma aplicabilidade prática para os leitores, de maneira que todos possam entender como o que está sendo explicado interfere diretamente na vida real. Nesse sentido, uma notícia divulgada recentemente pela mídia chamou a atenção de milhares de brasileiros: o Governo Federal, através do Ministério da Justiça e Segurança Pública, determinou a suspensão da venda de todos os celulares da marca iPhone no Brasil.

A decisão, aparentemente dura, se deu porque os celulares fabricados pela Apple estavam sendo vendidos sem os carregadores de bateria, o que viola conceitos básicos do sistema de defesa do consumidor. Além de proibir a venda dos telefones da marca, o Governo ainda aplicou à empresa uma multa de mais de R$12 milhões.

O argumento utilizado para fundamentar a punição é que, ao comercializar separadamente celulares e carregadores, a Apple estaria praticando a chamada “venda casada”, que é aquela situação em que o consumidor só pode adquirir determinado produto se também levar outro. Ou seja, como os celulares só podem ser utilizados se estiverem devidamente carregados, quem adquire um iPhone está obrigado a comprar, também, um carregador à parte.

Assim, fica demonstrada, na prática, a importância do direito do consumidor na defesa dos interesses legítimos da população, que pode contar com um sistema protetivo eficiente. Tanto é assim, que, antes mesmo da decisão no nível federal, a empresa já havia sido multada por Procons em vários estados brasileiros, além de já ter sido condenada em processos judiciais individualizados.

Em outras palavras, é plenamente possível que o consumidor que adquiriu um aparelho comercializado pela Apple, que veio desacompanhado de carregador, caso tenha se sentido prejudicado pela empresa, recorra à Justiça em busca de uma indenização reparadora do prejuízo suportado. Decisões judiciais, inclusive no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, têm reconhecido a falta de lógica na venda de celular sem carregador de bateria e determinado, além do fornecimento sem custo dos carregadores, o pagamento de indenizações.

O entendimento, entretanto, não tem sido o mesmo com relação aos fones de ouvido, que também não acompanham os celulares da marca, mas que não são considerados pela Justiça como indispensáveis à utilização dos aparelhos. Também por aí fica demonstrado o sentido das decisões judiciais e da própria multa aplicada à fabricante pelo Governo Federal: telefone celular, sem carregador, não pode ser plenamente utilizado por quem o adquire.

*Texto originalmente publicado na coluna própria do autor no jornal Pagina Revista (versão impressa), na 212ª edição, de setembro de 2022.