Covid-19: reações e consequências das medidas restritivas
Imagem ilustrativa.
LERROY TOMAZ | A escolha do tema a ser abordado neste espaço de opinião e informação é sempre um momento interessante. Por regra, o foco é dar prioridade aos assuntos da ordem do dia, àqueles que provavelmente mais interessam aos leitores. No terceiro texto publicado em nossa coluna online, o eixo central, infelizmente, ainda não pode ser outro. Há que se falar e repetir, enquanto for preciso, sobre a pandemia da COVID-19.
Na primeira publicação, tratamos dos desafios dos municípios no processo de vacinação (leia clicando aqui). O segundo texto, por sua vez, teve foco na necessidade de retomada do auxílio emergencial, aprovado pelo Congresso Nacional em março de 2020, que deixou de ser pago em dezembro último (disponível para leitura aqui). O ponto fora da curva, por assim dizer, foi um artigo sobre pensão alimentícia, publicado exclusivamente na coluna impressa, que se encaixa na linha editorial da prestação de serviços, também presente em nossa coluna.
Agora, a abordagem cuida das reações às medidas restritivas adotadas por governos estaduais e municipais na tentativa de frear a matança promovida pelo vírus, que, no momento em que escrevo, já interrompeu a vida de mais de 266 mil brasileiros. Entre o texto sobre o socorro emergencial, publicado há pouco menos de um mês, e o de agora, foram mais de 36 mil novas mortes.
Para a análise aqui proposta, é importante, antes de mais nada, que se faça uma separação de conceitos que frequentemente são confundidos. Primeiro o lockdown, que consiste em uma medida mais dura para restringir a circulação de pessoas e evitar a propagação do vírus, com o fechamento das atividades econômicas classificadas como não essenciais. A quarentena, em tese, é a tática de separar e limitar os deslocamentos daquelas pessoas que foram, ou podem ter sido, expostas ao vírus.
Já o isolamento, tecnicamente falando, consiste na separação dos contaminados daqueles que estão saudáveis. Não raro, a expressão tem sido confundida com o ato de ficar em casa e evitar o contato com outras pessoas, mesmo que não se esteja doente. Além disso, tem-se o distanciamento social, que nada mais é do que a guarda de uma distância segura entre as pessoas que estão circulando. Por último, há também o toque de recolher, que trata de proibição ao trânsito de pessoas nas ruas durante determinado intervalo do dia.
Muito resumidamente, são estes os significados das expressões mais frequentes no cotidiano da população durante a pandemia. Percebe-se, portanto, que as ferramentas disponíveis para o combate à pandemia possuem nomes diferentes, mas guardam essência comum: evitar que pessoas se aglomerem livremente, de modo que o vírus não seja amplamente disseminado na sociedade.
Se somam às medidas acima o uso de máscaras, tido como indispensável de forma quase unânime, salvo algumas irresponsáveis e vergonhosas exceções, e a vacinação, grande desafio da humanidade. Curiosamente, embora a vacinação seja consensualmente encarada como a chave potencial de retorno à dita normalidade, o ponto mais combatido e criticado tem sido a adoção das medidas de isolamento social, nominadas assim no sentido mais amplo da expressão, compreendendo as diversas práticas conceituadas acima.
Por produzir efeito negativo direto e imediato na economia, uma vez que restringe e limita drasticamente as relações comerciais, o isolamento é encarado por muitos como o grande vilão e inimigo número dois, perdendo apenas para o próprio vírus. Entretanto, é importante destacar e lembrar que apenas a vacinação pode permitir a retomada real da economia, e não os espasmos que temos experimentado, entrecortados por picos nos índices de ocupação de leitos hospitalares.
As vacinas, portanto, devem ser o ponto principal das reivindicações daqueles que, justamente, querem e precisam retomar o funcionamento de seus negócios e atividades. As medidas restritivas, guardadas as devidas proporções, devem persistir enquanto não houver percentual razoável de imunização no Brasil, evitando o colapso do sistema de saúde.
Enquanto governadores e prefeitos têm sido alvo de gritas e protestos por conta das medidas de restrição praticadas, tem ficado em segundo plano a atuação negacionista e negligente do governo federal na aquisição dos imunizantes. A farmacêutica Pfizer, por exemplo, confirmou ter ofertado ao Brasil 70 milhões de vacinas em agosto do ano passado. Foram três tentativas por parte da empresa, todas solenemente ignoradas pelo governo federal.
Na mesma linha, a Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) confirmou ter oferecido ao governo federal 50 milhões de doses da vacina Sputnik V, garantidas por um acordo firmado entre o governo da Bahia e o fundo de desenvolvimento russo responsável pela fabricação do imunizante. De acordo com o governador Rui Costa, a Bahia aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal para assinatura direta do contrato de aquisição das vacinas.
Neste cenário, senadores e deputados pressionam pela instalação da chamada “CPI da COVID”, que pretende investigar a atuação do governo federal no combate à pandemia. A União, a lentos passos, se articula para tentar fechar contratos com as farmacêuticas, mas enfrenta a concorrência internacional e a escassez de insumos e imunizantes, agravadas pela entrada tardia na corrida pela vacinação. Como consequência, o Brasil amarga o índice de apenas 4% da população vacinada, atrás de países como Chile e Marrocos.
Em linhas gerais, o presente texto tem o objetivo de, constatada a realidade atual, registrar sincera solidariedade, primeiramente, às famílias enlutadas no país, que choram a perda de seus entes queridos, mas também àqueles que estão amargando severos prejuízos com a debacle da economia, sobretudo os pequenos empresários e profissionais autônomos. E é justamente por isso que não se pode perder de vista qual deve ser a principal bandeira de todos aqueles que desejam a retomada da normalidade: vacinação.
Com a melhor percepção das prioridades por parte da população e os ajustes necessários na pauta de reivindicações, aos governantes de plantão não restará alternativa além da adoção de todas as providências para garantir a ampla imunização do povo brasileiro. Sempre atentos às orientações dadas pela ciência, única capaz de indicar os caminhos de saída da crise sanitária, os gestores públicos não podem falhar na condução do processo. Os que eventualmente desvirtuem devem ser severa e duplamente punidos: pela lei e pela história.
4 Comentários
Andrey Barros
11 de Março de 2021 às 09:33Interessante.
Camila Dias
10 de Março de 2021 às 22:30Perfeito!!!
Tássilla
10 de Março de 2021 às 19:59Enquanto tivermos representantes negando o alcance e gravidade do COVID-19, sofreremos demasiadamente com a superlotação no SUS, veremos pessoas morrerem sem sequer terem direito a um leito de UTI, pais , filhos e amigos, enterrarem seus entes queridos,sem poder se despedir. Parece que existem apenas dois caminhos, salvar vidas ou a economia. Vimos nos países que controlaram melhor a pandemia que o isolamento social foi a única alternativa encontrada, quando ainda não havia vacina. Entretanto, vemos no Brasil a ideia de que não se pode parar, pois empregos tem que ser preservados, a economia precisa se estabilizar. É aí que a figura de um líder comprometido faz a total diferença. Políticas públicas de incentivo deveriam ter sido implementadas, tanto para os empresários, quanto para a classe trabalhadora em geral, seja através de concessão de crédito e suspensão de contratos de trabalho, seja com pagamento direto de auxílio para os mais vulneráveis, para viabilizar um isolamento severo, mais conhecido como Lockdown. Todavia, as medidas adequadas não foram adotadas, completamos um ano de pandemia, sem que houvesse queda significativa de casos, passando pela pior fase desde então e, o pior, sem perspectiva de vacinação em massa da população. E, como bem sinalizado, a história será implacável com os omissos - e, por que não genocida?
Záfya Tomaz
10 de Março de 2021 às 10:55Excelente artigo! Esse tema precisa realmente ser debatido.