Embustes populistas necessitam de eleitores autoenganados

Imagem ilustrativa.

INALDO BRITO | O cenário político brasileiro é uma arena permeada, em sua maior parte, por lobos em peles de cordeiro, onde a presa (o eleitor) se engana em (e é levado a) pensar que pode ser beneficiado face ao seu predador (os políticos sanguessugas e populistas). Tal como aqueles torcedores devotados pelo time que ficam se atracando após cada um fazer valer a sua opinião, enquanto que diretoria e jogadores continuam suas vidas normais contratando e trocando de clubes, os eleitores “apaixonados” brigam e chegam às vias de fato, à medida que os seus políticos de estimação vivem de afagos e troca de favores entre si, conquanto na frente da TV finjam ser inimigos mortais.

Você já deve ter visto aqueles vídeos de documentário animal, em que o leão, antes de matar e devorar a gazela, brinca com ela até fazê-la cansar e chegar à exaustão. Então, não demonstrando mais nenhuma resistência, ela se entrega ao seu fatídico destino. Políticos sanguessugas e populistas agem de forma semelhante ao leão no tratar com o eleitorado: primeiro, eles perseguem os votos; ao obtê-los e vencer as eleições, eles manipulam o eleitor prometendo-lhes o impossível, mas esse impossível nunca chega, entretanto, o importante é manter as “esperanças” do eleitor sempre acesas, da mesma forma que a gazela ao achar que pode fugir depois de capturada.

Talvez a diferença entre o eleitor devotado e a gazela é que esta possui “clareza” instintiva da situação de vítima, enquanto aquele, mesmo sendo engabelado pelo político, continua a depositar nele as esperanças de melhora de vida. É até meio contraditório dizer isso, tendo em vista que o que se espera do eleitor, como ser humano que é, é o exercício da sua racionalidade e da compreensão dos fatos. Essa falta de exercício racional revela uma mentalidade tendente a ser manipulada e facilmente dominada.

Políticos sanguessugas e populistas se sentem ameaçados por quem pensa por conta própria, por quem não se deixa levar por promessas vazias e ilusórias, por quem não adere lados políticos como se estes fossem a última salvaguarda de uma sociedade, por quem não possui políticos ou partidos de estimação. Quem pensa fora das paixões políticas sempre será visto como um pária entre os eleitores devotados. Quem pensa fora das idolatrias políticas sempre será uma pedra no sapato entre os políticos sanguessugas e populistas.

Eleitores não são inocentes, mas são tratados como ingênuos e ignorantes. E a melhor forma de tratá-los assim é fazendo-os acreditar que precisam da “mão amiga” de um político qualquer. Por incrível que pareça, os mais pobres são os mais prejudicados com esse tipo de ardil. Por exemplo, já se tornou tradição, na temporada de chuvas, ocorrer alagamentos nos mesmos locais que ocorreram no ano anterior. Ruas são conhecidas mais por seus transtornos durante essa época do que seu comércio ou sua tranquilidade. Entre uma eleição e outra, promessas são feitas aos moradores, mas basta os candidatos assumirem suas cadeiras que o discurso muda. As obras, antes prometidas para o primeiro ano de mandato, só entrarão em curso no ano da próxima eleição, quando o político acelera os processos de licitação para mostrar que está trabalhando.

As obras começam, findam, mas qual não é a surpresa quando caem as chuvas e o alagamento ainda persiste? Os motivos são vários: materiais de segunda categoria utilizados na construção; serviço executado de forma indevida; falta de manutenção após a obra etc. Só que para o político nada disso importa. Para ele, a obra foi realizada e ponto. Vira até portfólio para sua próxima candidatura (poucos são os que vão investigar a condição atual). O que conta é a faixa sendo cortada no dia da inauguração e não os resultados catastróficos daquela obra de péssima engenharia.

De forma semelhante pensam os eleitores devotados desse tipo de político. Para eles também, a obra foi realizada. Isso é o que conta. Isso é o que os faz venerar ainda mais o político. Isso é o que os faz continuar promovendo o político. Isso é o que faz com que todos os possíveis crimes e corrupções praticados pelo político sejam cobertos, mesmo que essa cobertura seja uma mera cortina de fumaça. Para o eleitor devotado, o político é o cavaleiro do apocalipse que luta todas as batalhas; para o político, o eleitor devotado é um peão pronto a ser sacrificado na melhor oportunidade, com o aval e total consentimento deste.

Enquanto eleitores devotados se digladiam em prol dos seus totens políticos, estes decidem em encontros nababescos qual a melhor forma de continuar sugando a população, cobrando-lhes mais impostos, à medida que não diminuem seus próprios gastos. Enquanto eleitores devotados vociferam um contra o outro fake news dos seus candidatos, estes financiam às escondidas grupos e pessoas para criarem e disseminarem aquelas mesmas fake news. Enquanto eleitores devotados andam preocupados se o seu candidato ganhará a próxima eleição, este já sabe que jamais sairá derrotado, devido aos conluios e conchavos realizados com seus próprios “adversários”.

Manipulação. Controle. Domínio. Para políticos sanguessugas e populistas, são palavras que mais parecem músicas para os seus ouvidos. Para os eleitores devotados, bem... não importa muito o que pensam, desde que os seus políticos de estimação pensem por eles.