Há quase 12 anos em Xique-Xique Alex Roza fala da sua vivência como delegado

Foto: arquivo pessoal.

Administro um prédio público sem um único real. Tudo tem que ser na base do pedido de colaboração (...)

Prestes a completar 12 anos de atuação como delegado no município de Xique-Xique/BA, Alex de Sousa Roza, 46, bacharel em Direito concede entrevista ao Pagina Revista. Ao ser questionado sobre permanecer na cidade, Roza diz que mesmo diante das dificuldades - que não são poucas -, pretende continuar. Por ora eu não tenho planos de sair do Município, já que aqui estou adaptado e tenho o respeito dos meus pares e dos cidadãos desta terra que, inclusive, posso me considerar filho, pois ganhei o título de cidadão xique-xiquense. Mas, como dizem por aí, o futuro a Deus pertence”.

JORNAL PAGINA REVISTA | Delegado Alex de Sousa Roza, conte-nos como se deu seu ingresso na Polícia Civil.

Delegado Alex de Sousa Roza | O meu ingresso na Polícia se deu após participar de um concurso público para o cargo de legado de polícia Civil do Estado da Bahia, e após passar por todas as fases, assumi o cargo. O interesse surgiu desde a faculdade. O direito Penal foi sempre a matéria mais dinâmica e interessante, o que fez com que eu me interessasse pela área crime e, consequentemente, pela polícia Civil.

PAGINA REVISTA | Em que ano, e como se deu sua vinda para Xique-Xique?

Alex Roza | Em vim para Xique-Xique no ano de 2008, 01.04.2008, mais precisamente. Na época, eu fui nomeado sozinho e a cidade de Xique-Xique há mais de um ano não tinha delegado titular e era a prioridade da Polícia naquele momento. Aí não deu outra, fui nomeado para assumir o cargo de delegado de polícia Civil do Município.

PAGINA REVISTA | Relate-nos como o delegado encontrou o espaço físico da DP, e como a mesma se encontra. Houveram mudanças significativas de lá para cá?

Alex Roza | Naquela época, o estado da delegacia era muito ruim, precário, tanto no que diz respeito ao prédio, como imóveis e utensílios. Aí começou a minha peregrinação junto a polícia Civil, com o objetivo de reformar o prédio e conseguir móveis e equipamentos. Depois de pouco mais de um ano pedindo, oficiando, requerendo, houve uma licitação para a reforma do prédio, que foi executada. Após a reforma, começou uma segunda escalada para equipar a unidade.

A cada 15 dias eu estava na sede da Polícia em Salvador, fazendo requerimentos, até que consegui alguns móveis e equipamentos. Hoje, já contamos com mais de dez anos sem reformas, mas o prédio está relativamente bom; os equipamentos já merecem ser substituídos, pois estão ultrapassados, principalmente os de informática. O mesmo está acontecendo com os móveis.

PAGINA REVISTA | Como está sua equipe no momento? É suficiente pra um trabalho eficaz?

Alex Roza | No que diz respeito ao corpo de servidores, infelizmente, a polícia Civil nunca me proporcionou a equipe ideal, ou até mesmo razoável para executar o nosso trabalho de polícia judiciária. Há pouco tempo estava discutindo esse assunto com o atual coordenador de Irecê, sobretudo, em razão das cobranças que eu vinha sofrendo. Só para se ter uma ideia, uma cidade como Xique-Xique (hoje com aproximadamente 50 mil habitantes) teria de ter na unidade policial - Delegacia Territorial de Xique-Xique - o seguinte quadro funcional: 01 delegado titular, 02 escrivães, 03 investigadores no atendimento, 04 investigadores do SI (Serviço de Investigação), 02 servidores no administrativo, além de servidores na área de manutenção, isso diariamente.

Mas o que temos? 01 delegado titular, 01 escrivão, e 01 investigador; às vezes 02. Ou seja, a nossa condição de trabalho é péssima, mas ainda assim, com todo o empenho dos servidores que temos, com a ajuda dos nossos colaboradores, conseguimos dar uma resposta razoável. Só para você ter uma ideia da efetividade da polícia Civil aqui em Xique-Xique, eu vou citar dados dos homicídios do ano de 2019: foram 17 homicídios, dos quais 14 foram elucidados, ou seja, conseguimos, mesmo com toda precariedade de estrutura, solucionar mais de 80% dos homicídios ocorridos no Município; se for comparado com o índice de elucidação nacional, que gira em torno de 3%, é algo excepcional. E se tivéssemos uma condição ideal de trabalho? Com certeza, os resultados seriam bem mais satisfatórios. Enfim, continuaremos a trabalhar.

Ainda no tocante aos homicídios, este ano - até o momento desta entrevista -, estamos com três homicídios já solucionados e com os inquéritos encaminhados à justiça.

PAGINA REVISTA | Delegado, olhando de fora, quais os pontos positivos e negativos na permanência de uma autoridade policial por quase 12 anos, em um município? Isso não compromete sua função de delegado?

Alex Roza | Boa pergunta. Olhando de fora, não saberia lhe precisar, mas olhando de dentro eu só consigo ver vantagens. O primeiro ponto e o mais importante ao meu ver, sempre será a postura do profissional no contexto social e no respeito dado e adquirido. Hoje eu conheço uma boa parte dos cidadãos da cidade, suas índoles, seu proceder no meio social (...), o que por si só já facilita o nosso trabalho, separando o joio do trigo; ou seja: o bom cidadão, do mau cidadão. Segundo ponto: em razão desse conhecimento, tenho muito sucesso na resolução de conflitos sociais por ter o respeito das pessoas por conhecerem o nosso trabalho, que sempre foi pautado no respeito às pessoas e na obediência às leis.

Eu me lembro que quando aqui cheguei, as pessoas iam até a delegacia e queriam falar com o delegado, e quando via aquela figura franzina, torciam o nariz pois existia a ideia de que o delegado de polícia tinha de ser grande, bruto, mal educado, ignorante, que colocasse temor com sua figura física. A maioria não estava habituada com um profissional pequeno, educado. Com o passar do tempo, as pessoas viram que aquela figura do passado não mais existia e que o que deve prevalecer sempre é o respeito; e aqui estamos para carimbar o 12º ano à frente da delegacia de Xique-Xique, executando um trabalho limpo. Outros profissionais que para cá eram lotados, ficavam pouco mais de um ano e já pediam a sua remoção.

PAGINA REVISTA | É seu desejo continuar no Município, ou o delegado têm outros planos?

Alex Roza | Cheguei aqui em 2008, sendo esta a minha primeira cidade de atuação; atualmente eu também sou delegado substituto da cidade de Gentio do Ouro, onde, frise-se, eu não tenho nenhum servidor policial, mas como aqui, com nossas parcerias, respeito e trabalho limpo, também consigo conduzir muito bem aquela unidade policial. Por ora eu não tenho planos de sair do Município, já que aqui estou adaptado e tenho o respeito dos meus pares e dos cidadãos desta terra que, inclusive, posso me considerar filho, pois ganhei o título de cidadão xique-xiquense. Mas, como dizem por aí, o ‘futuro a Deus pertence’.

PAGINA REVISTA | Ainda falando de ‘permanência’, sua equipe tem sido reciclada, ou não?

Alex Roza | Infelizmente, hoje são muito poucos os cursos de reciclagem e quando os mesmos existem, são voltados aos profissionais que atuam na capital e região metropolitana, e quando são abertos para os colegas do interior, esbarramos nas despesas de deslocamento, estadia e alimentação que são suportadas pelos servidores e que acabam inviabilizando a reciclagem. Muitas delas, inclusive, são suportadas pelo próprio servidor, como eu, que sempre estou pagando aulas em estande de tiros e reciclagem legislativa que são importantes para o nosso trabalho.

PAGINA REVISTA | Quais são as suas maiores dificuldades para exercer a sua função com dignidade?

Alex Roza | As nossas maiores dificuldades são indubitavelmente o quadro de servidores. É impossível executar um trabalho de investigação sem investigadores. Investigação demanda tempo e pela dinâmica dos acontecimentos de crimes nesse Município, temos que priorizar os mais graves e de maior repercussão, quando na realidade, todos deveriam ter a mesma prioridade. Se eu tivesse o quadro ideal, poderíamos falar em facilidades; hoje, e desde quando entrei na Polícia, só encontro dificuldades.

Administro um prédio público sem um único real. Tudo tem que ser na base do pedido de colaboração, quadro de servidores insuficiente; administro uma carceragem com uma média de 35 presos, sem receber um centavo pelo desvio de função, mas a responsabilidade do preso é nossa. Reformamos a carceragem que há mais de uma década não registra fuga; se alguma outra delegacia tem problemas com presos, advinha para onde eles são removidos? E tantas outras dificuldades que existem. Já são tantos anos vivendo no caos, que se a bonança aparecer, vai me causar estranheza, estranheza boa, é verdade, mas estranheza.

PAGINA REVISTA | Comparando Xique-Xique com outras cidades do mesmo porte, como o delegado classifica a cidade nos crimes de: assassinatos, tráfico de drogas, estupro, pedofilia, assaltos e roubos, roubo de carros e motos?

Alex Roza | Hoje, na nossa região, Xique-Xique não pode ser considerada uma cidade violenta. Mesmo com a chegada das empresas eólicas, aumento de pessoas de fora etc., os índices de criminalidade não se alteraram; em vários casos, até vêm com uma seta em descendência.

Temos índices baixos de furto, de roubo, de estupro, roubos a carros e motos são baixíssimos, pedofilia também é baixo, não temos uma rede de tráfico forte; no que diz respeito a homicídios, oscila bastante, mas isso em razão de remanescentes do passado, mas vem melhorando muito.

Um crime que vem sempre em ascendência, são os vinculados a violência doméstica, a Lei Maria da Penha. Já em três anos consecutivos vimos registrando aumentos nesse tipo de crime; é um tipo de crime cultural - uma cultura tosca, mas cultural -, onde a mulher se submetia, para manter a família, a todo tipo de violência praticada por seu companheiro/marido. Estamos vivenciando mensalmente, campanhas e mais campanhas de combate a violência doméstica, o que vem encorajando as mulheres a denunciar seus companheiros agressores o que, por sua vez, aumenta os registro. Por isso percebemos um aumento da formalização de B.Os e procedimentos, e não um aumento, propriamente dito, da violência doméstica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Agradeço pelo espaço que me foi dado para esclarecimentos. É muito prazeroso. Não posso deixar de agradecer aos meus colegas, servidores do Estado, e não servidores, que comigo comungam todas as mazelas do nosso trabalho diuturno, mas que estão sempre à disposição para servir da melhor forma possível o seu colega e o cidadão de forma geral. Agradecer também aos nossos colaboradores e sobretudo ao cidadão que com informações, apoio, colabora com a elucidação de crimes em nosso Município.

Me sinto muito grato. Obrigado pela oportunidade, mas tenho algo a perguntar.

Eu, como entrevistado, gostaria que você externasse, com toda a sinceridade, como você vê a atuação desse profissional em Xique-Xique. Pergunto porque do lado de dentro, enxergamos de um jeito, e você, como jornalista, e sobretudo cidadão, vê de um outro ângulo.

Erasmo Deterra (...)

Sem puxa-saquismo, até onde lhe conheço, tens exercido seu trabalho com esmero e justiça, cumprindo com maestria sua missão que é a de investigar, elucidar e fazer cumprir a lei. Um profissional que sabe ouvir, e ser firme quando necessário. É possível melhorar? Sim, sempre podemos fazer melhor aquilo que já fazemos bem.

Mas podemos fazer diferente, delegado: é interessante que a sociedade xique-xiquense responda sua pergunta, deixando nos comentários – no jornal online -, suas opiniões. E os que tiverem acesso somente ao impresso, podem escrever para a redação: erasmodeterra@hotmail.com