Quem recebe BPC pode fazer empréstimo consignado?

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LERROY TOMAZ | Quem acompanha os artigos publicados nesta coluna já viu, em mais de uma oportunidade, a expressão “empréstimo consignado”. Afinal, já abordamos os descontos indevidos em benefícios previdenciários em função de empréstimos e de cartões de crédito consignados (confira clicando aqui e aqui), ambas as publicações com foco na defesa dos direitos do consumidor.

Diferentemente dos textos anteriores, não trataremos dos golpes propriamente ditos, mas de uma questão polêmica: a possibilidade de contratação de tais operações de crédito (empréstimos e cartões) por aqueles que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Conhecido por muitos pela sigla LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social), o BPC é um benefício assistencial no valor de 1 salário-mínimo mensal, pago a pessoas com deficiência, de qualquer idade, e a pessoas com 65 anos ou mais que não podem se manter sozinhas ou ser mantidas pela família.

Antes da Lei nº 14.431, de agosto de 2022, quem recebia o BPC não tinha acesso a empréstimos e cartões de crédito consignados, que eram liberados apenas para aposentados e pensionistas. Após ser sancionada pelo então presidente da República Jair Bolsonaro, a lei permitiu a realização de descontos e a retenção de até 45% dos benefícios assistenciais, o que gerou, à época, diversos questionamentos acerca da medida.

É o caso, por exemplo, de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o partido, a possibilidade de contratação de empréstimos e cartões com descontos tão altos por pessoas em situação de vulnerabilidade, como é o caso dos beneficiários do BPC, violaria, entre outros, o princípio da dignidade da pessoa humana.

De fato, quem acompanha de perto a realidade daqueles que recebem benefícios previdenciários e assistenciais, a exemplo dos advogados que atuam com Direito Previdenciário e do Consumidor, pode constatar o prejuízo que os descontos causam, muitas vezes, à própria sobrevivência das famílias dos beneficiários. Isso porque, no Brasil, a educação financeira está longe de ser realidade, ao contrário da fome, que tem levado muita gente a, diante das dificuldades, contratar os empréstimos e cartões mencionados.

De acordo com o INSS, mais de 5 milhões de pessoas recebem o BPC atualmente, sendo que, desse total, quase 1,7 milhão têm, pelo menos, um contrato consignado vinculado ao seu benefício ativo. Em média, o desconto realizado mensalmente é de R$434,97, o que corresponde a pouco menos da metade do salário-mínimo pago.

A polêmica, no entanto, parece ter terminado, já que o STF concluiu o julgamento da ação do PDT, no último dia 11/09, considerando que os empréstimos e cartões consignados podem ser contratados não só por quem recebe BPC, mas também por beneficiários de programas federais de transferência de renda, a exemplo do Bolsa Família. Com a liberação das operações, a tendência é que o número de contratos cresça, o que também deve causar um aumento no número de golpes, os quais poderão continuar sendo combatidos na Justiça, preferencialmente com o acompanhamento de um advogado especializado na matéria.

*Artigo originalmente publicado na coluna própria do autor no jornal Pagina Revista (versão impressa), na 224ª edição, de setembro de 2023.