A artificial polarização política entre o povo esconde a verdadeira divisão do país
Imagem ilustrativa.
“Em política, a comunhão de ódios é quase sempre a base das amizades.” Alexis de Tocqueville
INALDO BRITO | As pesquisas eleitorais para presidente da República mostram que os próximos quatro anos nada mudará para melhor na conjuntura econômica do nosso país. As pesquisas apontam o confronto direto entre Lula e Bolsonaro, com chances mínimas para aqueles que tentam correr por fora. A Terceira Via, que muitos achavam que seria encabeçada por Sergio Moro, minguou, arrefeceu, se anulou e foi anulada por sua própria cúpula. Tudo indica que o segundo turno (se houver) será para se escolher entre a cruz e a espada – nada está tão ruim que não possa piorar.
O país continuará sendo governado pelo patrimonialismo e populismo que alçou os dois candidatos em destaque. Lula e Bolsonaro perpetuam a polarização de fumaça, cuja ação de seus militantes (o “povão”) é diametralmente oposta à desempenhada por seus interlocutores (os “lambe-botas” engravatados). O clima de polarização entre esses dois postulantes e seus partidos não corresponde ao interior e aos recônditos do poder – não é e nunca foi. Desde a redemocratização que o que vemos nas corridas eleitorais, debates e gestões é puro fingimento e cortina de fumaça.
Quem não se lembra de que em 92 o próprio Partido dos Trabalhadores foi fundamental para destronar Collor da presidência da República? Entretanto, poucos se lembram de que em 2010 o próprio Collor foi alçado a uma cadeira no Senado Federal com o apoio de Dilma Rousseff (do Partido dos Trabalhadores). E o que é ainda mais cínico é que nas eleições desse ano (2022), Collor postula o cargo de governador de Alagoas tendo o apoio de, nada mais nada menos, Bolsonaro.
E o que dizer do ex-candidato à presidência Geraldo Alckmin, adversário de Lula nas eleições de 2006, que “apoiou” até mesmo o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, “crítico” do Partido dos Trabalhadores, mas que hoje integra a chapa como vice justamente daquele que sempre foi alvo de sua crítica cínica - Lula. Bolsonaro, com todo o seu desvario em querer proteger a qualquer custo sua própria família (filhos, especificamente), interferiu no comando da Polícia Federal de formas tão descabidas e despropositais que demonstrou a todos os seus correligionários e colegas parlamentares que no fundo não era assim tão reacionário e contra o sistema como tentou passar tal ideia na sua campanha presidencial em 2018. Bolsonaro, Lula, Collor, Dilma, Alckmin entre outros fazem parte de um teatro – no contexto político-ideológico, isso é chamado de teatro das tesouras.
O ponto que estou tentando mostrar é que a população (os eleitores) vive em querelas e disputas politiqueiras inúteis e fúteis protegendo e defendendo candidatos que não estão nem aí para eles. O povo, a militância, os eleitores, todos são uma simples massa amorfa nas mãos de políticos populistas interessados única e exclusivamente em perpetuar seus maus governos e más gestões, ao mesmo tempo em que perpetuam a simbiose com seus “adversários” e rivais de candidatura.
Defendo que a polarização que até mesmo os jornais tentam emplacar como algo concreto e que pode trazer riscos à democracia é uma polarização de fumaça, pois, tal como na eleição presidencial anterior de 2018, assim que essa de 2022 se acabar, independentemente do ignóbil que for eleito, o clima de aparente tensão no ar vai se arrefecer, a população continuará conformada e até mesmo esquecerá o que aconteceu, haverá uma amnésia coletiva. Os problemas econômicos não serão resolvidos, pelo contrário, independentemente de qual dos dois for eleito, a gastança continuará ainda mais sórdida - uma das propostas de Lula, por exemplo, seria suspender o teto de gastos, o que faria jorrar dinheiro público a torto e a direito para partidos e políticos sempre tendo como pano de fundo alguma demanda “estratégica” (seja pagamento de salários a funcionários públicos ou a execução de obras públicas faraônicas ou megalomaníacas, por exemplo).
O que podemos constatar disso tudo é que a divisão no país nunca foi entre esquerda e direita, como os próprios políticos tentam nos fazer acreditar (tendo em vista que, como assinalado acima, quando as luzes se apagam e as cortinas se abaixam, eles se imiscuem, tramando mais estratégias de como se manter no poder ou de como enganar a massa que os segue). Pelo contrário, a verdadeira divisão no país é entre quem está acordado antes do galo cantar e quem está dormindo em berço esplêndido; entre quem trabalha e quem parasita os que trabalham; entre quem fica rico produzindo para beneficiar o próximo e quem fica rico subornando e sendo subornado; entre quem é prejudicado por cumprir a lei e quem é privilegiado ou protegido por descumpri-la; entre quem é mal visto por ser honesto e quem é recompensado por ser corrupto.
O que nossa população mais necessita é de um “ateísmo político”: não idolatrar, não defender fideisticamente e nem confiar em político algum. Todavia, os “santinhos políticos” e os “políticos de estimação” que possuímos ainda são muitos e paulatinamente continuamos a alçar ao panteão cada novo candidato que surge ou velhas raposas que se insurgem como representantes da “nova política”. Nós mesmos nos colocamos entre cruzes e espadas!
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