Em defesa do Estado Democrático de Direito

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LERROY TOMAZ | Uma das principais transformações promovidas pelo avanço da internet e das redes sociais foi, sem dúvidas, a popularização do debate público. Para o bem e para o mal, a participação popular nas discussões sobre temas sociais e políticos complexos tem aumentado de forma considerável através das redes. Entre os conceitos mais comentados, está o chamado Estado Democrático de Direito.

Embora o assunto esteja sendo abordado com frequência até nas conversas mais banais, a maior parte da sociedade não compreende o real significado da expressão. De maneira resumida, é possível dizer que o Estado consiste em um grupo de pessoas e instituições organizadas em um mesmo território. O “de direito”, por sua vez, está relacionado ao conjunto de regras e leis comuns a todos.

Por fim, o termo “democrático” indica o respeito às liberdades e garantias individuais. Além disso, significa dizer que as regras seguidas no Estado são formuladas democraticamente, através de representantes eleitos pelo povo. É neste ponto que as democracias se diferenciam das ditaduras, pois em regimes ditatoriais até existe a figura do Estado, mas as regras que neles imperam são estabelecidas de forma autoritária e impositiva.

No Brasil, a consolidação do Estado Democrático de Direito se deu com a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988. Apesar dos apelos irracionais de uma minoria barulhenta, a democracia sobrevive tendo como um de seus pilares a realização de eleições periódicas com voto direto, secreto e universal. Quem atenta contra a realização regular das eleições ataca, portanto, o próprio Estado Democrático de Direito.

É o caso, lamentavelmente, do atual presidente da República, que em recentes declarações deixou ainda mais claro aquilo que sempre demonstrou: seu desapreço pela democracia. Além de afirmar que o Brasil corre riscos de não ter eleições em 2022, o presidente alega, em diversas oportunidades e sem jamais apresentar nenhuma prova, que as urnas eletrônicas utilizadas no país são passíveis de fraude. As mesmas urnas que, desde 1988, garantiram ao clã Bolsonaro sucessivas e inquestionadas vitórias.

Agora, quando as pesquisas eleitorais indicam o crescente derretimento da popularidade do presidente do Brasil, a retórica utilizada por Donald Trump, nos Estados Unidos, é repetida por aqui. Nos EUA, onde o voto é impresso, os inconformados com o resultado das eleições do último ano alegaram ter havido fraude. Aqui, onde o voto é eletrônico, a mesma tática é ensaiada, desafiando qualquer lógica argumentativa.

O Tribunal Superior Eleitoral, em firme e necessária nota enviada à imprensa, defendeu a integralidade das urnas eletrônicas, utilizadas desde 1996. Entre os pontos destacados pelo ministro Barroso, atual presidente do TSE e alvo preferencial dos ataques do presidente da República, estão a alternância de poder garantida pelas urnas. Urnas das quais já saíram vitoriosos políticos dos mais distintos matizes político-ideológicos, incluindo o próprio presidente Bolsonaro e seus filhos, em diversas e sucessivas eleições.

A fragilidade das acusações ficou ainda mais clara a partir do momento em que o corregedor-geral eleitoral enviou ofício ao presidente, solicitando ao mesmo que apresentasse as provas que diz ter das fraudes ocorridas no pleito de 2018, mas não obteve resposta. Na mesma linha do TSE, líderes de 9 partidos políticos assinaram carta em defesa dos valores democráticos, engrossando o coro de vários políticos que repudiaram o devaneio de golpe verbalizado pela maior autoridade do país. As notas, apesar de oportunas e necessárias, devem vir acompanhadas de ações concretas e efetivas, pois têm se mostrado insuficientes para interromper o ciclo de ataques à ordem democrática.

Por tudo isso, as instituições que formam o Estado Democrático de Direito devem se levantar em defesa da manutenção da ordem social, protegendo o Brasil daqueles que, por retórica ou na prática, defendam ou pratiquem qualquer ato golpista. Garantir a realização das eleições marcadas para 2022 é, portanto, medida urgente e necessária. Lá, diante das urnas eletrônicas, o povo brasileiro, ciente da importância da democracia conquistada a duras penas, certamente terá a sabedoria necessária para corrigir erros do passado e endereçar o país rumo ao futuro.