Representatividade na política é o engodo do servilismo social
Imagem ilustrativa.
INALDO BRITO | Diversas bandeiras de representatividade são levantadas nesse período de eleição. Não que se restrinja somente a esse momento, mas é notório como muitos candidatos se enveredam pela vida pública abrindo suas asas o máximo possível a fim de atender a maior quantidade possível de pessoas que se enquadram em determinados grupos. Essa estratégia é bem comum na política, embora o que acarreta é sempre um governo para minorias.
Nessas últimas décadas, vimos uma escalada sem precedentes do Politicamente Correto nos mais diversos campos sociais, e não era de surpreender que atingisse também a política. No cenário brasileiro, foram estabelecidas cotas para mulheres utilizando-se como justificativa o fator representatividade. Segundo os proponentes dessas vantagens, o ambiente político estava repleto de homens brancos, o que, segundo eles, tornava as decisões legislativas um tanto arbitrárias.
Então, em vez de propor regras melhores para mitigar os riscos dessa arbitrariedade, eles preferiram partir para um outro extremo, que foi estabelecer cotas para que outros grupos sociais e de gênero também pudessem ser ouvidos. O problema advindo dessa constatação é que possuir representatividade torna-se mais importante do que a capacidade técnica requerida para o cargo. Se, antes, reclamávamos da ignorância, estupidez e inépcia de alguns políticos, depois do estabelecimento de cotas femininas na política, não mudamos muita coisa sobre o que reclamar, pois se havia políticos homens brancos agindo de forma egocêntrica e arbitrária, dá-se semelhante no caso de parlamentares mulheres. Narcisismo político, politicagem e corrupção não escolhem gênero.
Conquanto a lei tenha estipulado uma reserva mínima para candidaturas femininas (em torno de 30%, mesmo que não se preencha todo esse valor), o grande problema é que ainda há uma procura mínima das mulheres pela vida política. Alguns partidos exclusivamente femininos foram fundados para quebrar o possível receio que muitas mulheres possuíam de adentrar no cenário eleitoral, e mesmo assim, no presente momento, ainda não conseguem causar o impacto e atrair o número de figuras femininas que se deseja. Isso porque, tal como os homens, boa parte do público feminino não adere um partido só por ser de mulheres. Pelo contrário, muitas delas analisam o perfil ideológico da sigla antes de se vincular.
Curiosamente, a partir de 2018, o percentual de reserva para candidaturas femininas foi também colocado à disposição de transgêneros, transexuais e travestis. Como Bruno Garschagen apontou em seu livro Direitos máximos, deveres mínimos – o festival de privilégios que assola o Brasil:
“Como os partidos políticos tinham dificuldades a cada pleito de conseguir candidatas para cumprir a Lei das Eleições, a liberação pelo TSE viria a calhar para certas legendas. Mas criaria uma situação curiosa: a cota de 30% para mulheres seria em parte ocupada por candidatas que nasceram com o sexo masculino. No futuro próximo, será bem possível que um partido seja todo constituído por homens de nascimento, héteros e transgêneros.”
E ainda mais curioso foi que essa propositura foi feita justamente por uma mulher, a senadora do Partido dos Trabalhadores (PT) Fátima Bezerra. Isso só serviu para provar que nem sempre a proposta de cotas possui como objetivo apenas um grupo; a tendência é que essa cobertura continue se expandindo mais e mais a fim de granjear um número cada vez maior de grupos representados, mesmo que eles sejam diametralmente opostos entre si.
Como a mentalidade do Politicamente Correto não possui inteligência, é de esperar que mais cedo ou mais tarde a pressão de alguns grupos minoritários (diria até ligados a pautas feministas) sobre o alto escalão do legislativo e judiciário proporcione que a cota para candidatura partidária se transforme numa cota de posse em cargo político de facto. Esse é o processo natural de qualquer adesão ou implementação de cotas na sociedade. Primeiro são reservadas algumas poucas vagas; depois, quando vê que ainda não é atendido o número esperado, amplia-se o número de vantagens para o grupo cotado; e, por fim, não demora até que a cota se torne o próprio padrão em vez de apenas um mero adendo.
Foi assim que aconteceu nas cotas universitárias, cujas vagas reservadas para os mais variados grupos, assim estabelecidos pelos partidos políticos e instituições afins (negros, índios, baixa renda e até LGBT), retalharam por completo o quantitativo disponível nas universidades a fim de garantir aos seus grupos o direito à entrada no curso específico. Se, antes, a preocupação era colocar as pessoas a qualquer custo, de algum desses grupos, na universidade, de forma a lhes garantir oportunidades iguais no mercado de trabalho posteriormente, hoje os tentáculos das cotas estão se expandindo pouco a pouco também para o mercado de trabalho, exigindo o estabelecimento de reserva de cargos a serem ocupados por pessoas que se enquadram em um dos grupos citados. Em suma, é como se tivesse sido criado um novo grupo social: o cotista cidadão.
Há outras formas de se incentivar o ingresso na vida política como, por exemplo, o ensino da ciência política desde os anos de educação fundamental na escola, por meio de professores capacitados tecnicamente e que não sejam meros aliciadores políticos, bem como no ensino correto sobre as leis e Constituição de seu próprio país, tornando a aula dinâmica e cativante. Assim, fica possível despertar o interesse dos jovens (homens e mulheres) em se candidatarem nos pleitos eleitorais com a mentalidade voltada não para representar exclusivamente os grupos A, B ou C, mas ser um representante que ateste os interesses de todo um alfabeto social, entendendo que representar um povo não é buscar agradá-lo com pão e circo, privilégios ou vantagens, mas sim promover a ele as oportunidades necessárias para que possa desenvolver suas habilidades técnicas e capacidades intelectuais e inovadoras por conta própria, sem necessitar do assistencialismo barato ad infinitum que, por incrível que pareça, vem disfarçado de representatividade.
Quem busca se fazer notado por ser representante de algum grupo só demonstra querer tornar aquele mesmo grupo no seu próprio curral eleitoral. Isso ainda continua garantindo a eleição de muitos candidatos, mas quem quiser verdadeiramente mostrar que é diferente, ainda que não seja eleito, precisará se desvencilhar desse ranço politiqueiro. Como poderá haver mudança se a maioria dos candidatos pensa e age igual aos seus concorrentes e antecessores? Se os candidatos imitam o que é ruim no pleito e se fazem valer da politicagem (especificamente no que diz respeito à representatividade de cabresto), é ingenuidade dos eleitores achar que esses mesmos candidatos farão a diferença quando forem eleitos.
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